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Paris será feliz nos Jogos, diz prefeita da sede olímpica – 05/05/2024 – Esporte


Polêmicas relacionadas aos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2024 não faltam, mas a pergunta que Anne Hidalgo, 64, mais tem ouvido nos últimos meses é: “A senhora vai tomar banho no rio Sena?”. A resposta é sempre a mesma: “Sim, eu vou mergulhar”. A data aproximada já foi anunciada: entre 23 e 30 de junho, a depender da meteorologia.

Essa questão aparentemente prosaica se tornou uma espécie de símbolo do êxito ou do fracasso dos Jogos na cidade governada por Hidalgo há dez anos. O banho de rio é interditado no poluído Sena, que atravessa Paris, há um século (embora, na prática, até os anos 1970 ainda se vissem banhistas sem medo de coliformes fecais).

A França investiu 1,4 bilhão de euros (cerca de R$ 7,6 bilhões) para despoluir o rio a tempo de nele realizar a maratona aquática e a parte da natação na prova de triatlo dos Jogos de 2024. A pouco mais de dois meses da abertura do evento, não se sabe ainda se tamanho investimento deu certo. No ano passado, eventos-teste chegaram a ser cancelados devido à qualidade da água.

Hidalgo diz não ter dúvidas sobre a balneabilidade do Sena em julho –e tampouco sobre o sucesso dos Jogos, apesar do famigerado pessimismo dos parisienses. Em uma pesquisa divulgada em março pelo instituto Ipsos, 47% dos moradores da capital francesa responderam que pretendem fugir da cidade durante o evento, temendo o caos.

“É uma pena, mas vamos dar a eles vontade de ficar”, afirma a prefeita. Entre os argumentos apresentados por ela, estão os 26 espaços com festas gratuitas que funcionarão por toda a cidade, no período olímpico e paralímpico.

A prefeita recebeu a Folha em seu gabinete de estilo clássico, de 170 metros quadrados. Da janela próxima à sua mesa, avista-se o trecho do rio onde, ela garante, vai nadar daqui a pouco mais de um mês.

A senhora esteve no Rio de Janeiro em 2016 e tem sabidamente uma boa relação com o prefeito Eduardo Paes. Aprendeu alguma lição, positiva ou negativa, com os Jogos daquele ano?

Antes de tudo, lições positivas. Lembro que em 2016, quando perguntei a respeito a Eduardo Paes, ele me disse: “Sabe, o último ano é terrível, então você precisa estar pronta o mais cedo possível”. Saí daquela conversa dizendo a mim mesma e a toda a minha equipe: “É preciso estarmos prontos um ano antes”.

Assim, programamos nossa agenda de infraestruturas que precisavam ser construídas para os Jogos de Paris, ainda que não tão numerosas, com base no fato de que tínhamos que estar prontos bem antes. E foi o que fizemos. Entregamos a maior parte da nossa infraestrutura. Entregamos [em fevereiro] as chaves da Vila Olímpica e Paralímpica e inauguramos a Arena de Porte de la Chapelle [sede do badminton e da ginástica rítmica]; estamos terminando sem corrida de última hora, para receber a todos.

Alguma outra lição?

O segundo elemento é o reaproveitamento de tudo o que é temporário. Discutiu-se como reutilizar de maneira melhor as infraestruturas e itens efêmeros, para que não se tornem elefantes brancos. Trabalhar com Eduardo Paes foi muito útil para nós. O que ele nos contou se deve à sua experiência com o legado.

Tínhamos planejado fazer na região de Aubervilliers uma piscina olímpica para todos os esportes aquáticos, o que exigia uma capacidade de cerca de 15 mil a 20 mil espectadores. Um número tão grande, como legado, não é necessário para uma piscina permanente. Então, decidimos mudar o planejamento: ou seja, criar em Aubervilliers um centro aquático menor, que terá saltos ornamentais, polo aquático e nado sincronizado, mas realizar as provas de natação em outra arena [já existente], em La Défense.

A senhora convidou Eduardo Paes para mergulhar no Sena?

É claro. Ele e outros prefeitos. Não sei se ele virá nessa data [final de junho], porque muitas autoridades foram convidadas para a abertura dos Jogos.

Em relação ao risco de atentado na cerimônia de abertura, quais os critérios para uma possível mudança de planos?

Não temos outro plano a não ser o A. O alfabeto tem 26 letras, mas não sei de plano B. O sinal a ser enviado não é dizer àqueles que querem nos fazer mal: “Estamos com medo e vamos mudar tudo se vocês quiserem nos ferir”.

Não é como se fôssemos uma cidade que nunca conheceu o horror. Em 2015 sofremos atentados. Foi também por causa deles que eu decidi envolver Paris nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Estávamos em um ambiente de inquietação geral. Pensei: o que poderia devolver a energia a todo um país, focando algo positivo? Esse era o motor que permitiria nos reerguer e mostrar que não temos medo.

Em 2017, quando Paris foi escolhida como sede, o mundo era diferente. Agora há guerras na Ucrânia e em Gaza. Isso levou a alguma mudança no dispositivo de segurança?

Isso eleva o grau de importância da segurança, é claro. Um fator novo é a conscientização para o risco da cibersegurança. Diversos relatórios mostram que os franceses são muito ingênuos em relação a esse risco. A Rússia, o Azerbaijão e o Irã, principalmente, são países que usam muito as “ciberarmas” para desestabilizar as democracias. A França tem uma agência nacional, a Anssi [Agência Nacional da Segurança dos Sistemas de Informação], que alerta muito rapidamente quando acontece alguma coisa.

Vimos isso, por exemplo, quando houve a polêmica sobre os percevejos, que aparentemente eu fui instalar pessoalmente em cada colchão de cada apartamento de Paris [risos]. Descobrimos, depois de análises, que a amplificação dessa polêmica foi feita por agentes russos. Também sofremos um ataque viral do Azerbaijão. No Irã, eu sou persona non grata. É um risco novo, sobre o qual há uma enorme vigilância.

O que a senhora responde sobre as denúncias de uma “faxina social”, feitas por diversas ONGs?

Temos que ter um grande compromisso com as pessoas que não têm onde morar. Paris é um lugar, como outras grandes cidades da Europa atualmente, aonde chegam migrantes e refugiados. Para mim, dizer “limpem a cidade, e depois a gente vê” não pode ser um compromisso.

Estamos trabalhando dentro dos valores de Paris. Propus ao governo, porque a responsabilidade é do governo nacional, locais onde podemos acolher mais de mil pessoas em condições humanas, que respeitam nossos valores humanistas. Ainda não conseguimos, mas para mim isso também é um dos legados dos Jogos Olímpicos.

O que a senhora achou do aumento das passagens de metrô para os visitantes em Paris durante os Jogos, de 2,15 euros para 4 euros [aproximadamente de R$ 12 para R$ 22, decidido pela governadora da região parisiense, Valérie Pécresse, adversária política de Hidalgo]?

É bizarro. Eu não teria feito isso, mas não é responsabilidade minha, e eu não estou aqui para atrapalhar. É uma decisão que foi tomada sem que eu tivesse sido consultada. Então, não sou obrigada a respaldar. Fiz aquilo que estava dentro da minha alçada, como o prolongamento de uma linha de bonde, a criação de 450 quilômetros de ciclovias –o equivalente à distância Paris-Brest, nome, aliás, de um excelente doce francês [risos]– e uma rede de ônibus com acessibilidade total.

A senhora governa Paris há dez anos. O que mudou na Paris que o torcedor brasileiro vai encontrar aos Jogos Olímpicos?

Sei que os brasileiros gostam muito de Paris. Gosto muito do Brasil também. Eles vão encontrar o calor humano de uma cidade cosmopolita, que quer compartilhar sua beleza com o resto do mundo. Em primeiro lugar, verão, claro, uma Paris eterna, porque, quando se vem a Paris, há toda uma história que tem bem mais de dez anos.

Paris é uma cidade excepcional, com sua “art de vivre”, gente que gosta de sair, gosta de cultura, de andar na rua, de bistrôs, restaurantes, cafés. Os brasileiros vão continuar encontrando isso, mas também vão encontrar uma Paris que mudou muito nos últimos dez anos.

De que forma?

Paris se tornou mais verde. Plantamos muitas árvores. Muitas ruas foram quase transformadas em “ruas-jardins”, principalmente em frente a escolas. As margens e o cais do Sena se tornaram um imenso passeio público. Antes eram uma via expressa. Também vão encontrar muito mais gente pedalando, já que agora as pessoas se deslocam muito mais de bicicleta e a pé em Paris. A bicicleta ultrapassou o carro, em número de pessoas que utilizam esses meios de transporte.

Também encontrarão um ar mais limpo, porque tudo isso reduziu a poluição em 40%. E, o que é muito, muito, importante, vão encontrar uma cidade feliz, uma cidade que está com a catedral de Notre-Dame ainda em reconstrução [a reinauguração está marcada para dezembro], mas que será completamente visível por fora na época dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Então, encontrarão muita alegria.

Raio-X | ANNE HIDALGO, 64

Nascida na Espanha como Ana María Hidalgo Aleu, migrou com os pais para a França quando tinha dois anos. Naturalizou-se e afrancesou o nome aos 14 anos. Formada em ciências sociais pela Universidade de Lyon, foi fiscal trabalhista, assessora no Ministério do Trabalho (1997) e vice-prefeita de Paris (2001). Prefeita (Partido Socialista) desde 2014, foi reeleita em 2020. Candidata à presidência da França em 2022, teve apenas 1,7% dos votos.



Fonte: Folha Uol

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